Desenvolvido em Ceilândia, projeto pedagógico da professora Gina Vieira que ganhou reconhecimento dentro e fora do país será apresentado em formato de livro
Da Redação
Exemplos de professores que oferecem boas práticas pedagógicas aos estudantes devem ser reconhecidos. Por esse motivo, o secretário Júlio Gregório Filho recebeu, no gabinete da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer do Distrito Federal, a professora Gina Vieira Ponte de Albuquerque, com o objetivo de parabenizá-la pelo trabalho desenvolvido com seus alunos, que não somente trouxe benefícios ao aprendizado escolar como também ganhou notoriedade internacional. É que no ano passado, a educadora, que atuava no Centro de Ensino Fundamental 12 de Ceilândia, foi vencedora do Prêmio Ibero-americano de Educação em Direitos Humanos e trouxe o prêmio de US$ 20 mil oferecido pela Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI). Entre representantes dos 22 países-membros, ela foi a única brasileira na competição. Agora, a educadora de 43 anos pretende lançar, em março, um livro com a coletânea do projeto premiado, o Mulheres Inspiradoras, desenvolvido com os alunos do nono ano do ensino fundamental da escola.
A ideia teve início quando a professora de português decidiu criar uma página em uma rede social como ferramenta pedagógica e para conhecer melhor os alunos. “Causou-me grande surpresa quando uma das alunas postou um vídeo dançando com pouca roupa e com um forte apelo sensual e se sentiu valorizada com os comentários grosseiros deixados na postagem”, disse a educadora, que, além de refletir sobre os casos de exposição como o sexting e sobre o conteúdo seguro para internet, também aplicou um questionário para saber o que eles acessam na rede e o motivo de utilizarem as redes sociais. “Ao decidir postar um selfie com conotação sexual os alunos não tem consciência dos riscos envolvidos”, avalia.
Primeiro, veio a leitura de livros de escritoras renomadas, como “Eu sou Malala”, “O Diário de Anne Frank” e “Quarto de Despejo – Diário de uma Favelada”, este último de Carolina Maria de Jesus, que mostram exemplos de mulheres fortes, de diferentes classes sociais, cor da pele, nível de alfabetização e nacionalidade.Em seguida, os estudantes refletiram sobre a biografia de 10 mulheres que fizeram importantes contribuições à humanidade na defesa dos direitos humanos, como Anny Frank e Maria da Penha, por exemplo. Por fim, a classe foi desafiada a escrever e contar histórias de mulheres da comunidade de Ceilândia. A partir disso, os alunos aprenderam, por meio da valorização do papel da mulher, a evitar práticas comosexting, que é o compartilhamento de imagens ou gravações íntimas por meio de aplicativos ou rede sociais.
Por fim, no bojo das discussões sobre Maria da Penha, realizaram a campanha “Eu digo não a qualquer forma de violência contra a mulher”. No protesto pacífico, as pessoas empunhavam o cartaz com esses dizeres e postavam nas redes sociais com a perspectiva de criar uma corrente do bem e mostrar para eles e elas que a tecnologia é algo superpositivo se a gente souber usá-la com responsabilidade.
Para a professora, é missão da escola ajudar a refletir sobre os problemas cotidianos. “A escola fechada em si mesma, voltada apenas para o conteúdo dos livros, não serve para a complexidade do que estamos vivendo. O compromisso deve transcender a aprovação no vestibular”, pondera Gina, que, durante a execução do projeto, percebeu que os estudantes estão insertos numa proposta pedagógica que não dialoga com a realidade deles. “A gente tem um desafio muito grande que é o de superar o modelo educacional posto há bastante tempo e está apartado da realidade dessa geração. A escola não tem feito muito sentido para eles”, justifica ela, atribuindo a isso o fato de que muitos resistem a estar em sala de aula. “É necessário que tenhamos uma escola que dialogue com o tempo atual, com as novas gerações, com as novas tecnologias. Os meninos e as meninas mais envolvidos com as propostas o fizeram porque o projeto buscou privilegiar o protagonismo deles”.
O secretário Júlio Gregório Filho não somente concorda, como apoia este pensamento. Para ele, a proposta de se afastar do modelo educacional em que o professor está no centro do processo pedagógico é um desafio que deve sempre ser almejado. “A construção do saber passa por essa desconstrução do modelo em que o professor é o dono da verdade absoluta, mas está preparado a interagir com os questionamentos que os alunos trazem da sociedade. Essa visão da aula maçante já deveria ter ficado no passado”, avalia o educador.
Antes de atingir o reconhecimento internacional, o projeto Mulheres Inspiradoras foi ovacionado no Brasil, ganhando o primeiro lugar na quarta edição do Prêmio Nacional de Educação em Direitos Humanos, pelo qual recebeu R$ 15 mil e um troféu no Ministério da Educação. O prêmio tem o objetivo de contribuir para a formação de uma cultura que defenda valores, atitudes e práticas sociais que respeitem os direitos dos cidadãos em todos os espaços da sociedade. O prêmio recebeu candidaturas de diversas instituições entre públicas e privadas de educação básica e superior, além de secretarias de educação e instituições do terceiro setor. O projeto de Gina Albuquerque foi selecionado dentre cerca de 260 trabalhos inscritos, provenientes de todas as regiões do país.
Com o mesmo projeto, Gina também foi uma dos 39 professores da rede pública de ensino premiados, em dezembro de 2014, no 8º Prêmio Professores do Brasil, do Ministério da Educação, por iniciativas que contribuíram para a melhoria da educação básica no país. O concurso contou com 6.808 projetos de mais de 2 mil municípios e selecionou trabalhos desenvolvidos em diferentes etapas da educação básica. No início daquele mesmo ano, a educadora já havia sido ovacionada com o Prêmio Mulher Destaque Flores de Aço de 2014.